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terça-feira, 27 de maio de 2008

Hello Patinho!



Assisti no final de Abril as apresentações de TCC da Faculdade Belas Artes. O tema onipresente era a Arte - educação. Auditório lotado, hordas de alunos amontoavam - se no palco lutando por coerência.
Assustou-me que a totalidade das pesquisas sobre arte-educação utilizou abordagem de pesquisa empírico-quantitativa.
Arte educação explicada, estudada, traduzida em tabelas, gráficos, estatísticas.
Fiquei nauseado. Algo importante ficava de fora.
Por que o tratamento árido num tema tão fecundo?
Por que ressecamos nossa rica área de conhecimento em nome da "ciência"?

Essa conduta não é privilégio daquela ótima faculdade.
Foi mais fácil identificar o erro naqueles pobres alunos. Mais tarde a ficha caiu. "Também faço isso". Como professor de música também tento ser "respeitado", ou "levado à sério" forjando um comportamento austero.

Por que fazemos isso? Essa pergunta me acompanhou por uns dias.
Seria eu, como artista, "menos sério" que as outras profissões?
Vamos rastrear o assunto:

Quando o tal método empírico apareceu (John "muito" Locke), filósofos e cientistas ficaram alvoroçados. Era o séc. XVIII. Havia a esperança de provar Deus através dos experimentos.
O tempo confirmou a impossibilidade da aventura. A pergunta “Como podemos provar a existência de Deus” foi substituída pelo axioma “É errado perguntar sobre a existência de Deus”. Junto com Deus, foi-se pelo ralo da história todo o espectro de possibilidades abertas do interior humano. Espiritualidade, arte, emoções, anseios, desejos, sonhos. Tudo ilusão. Ao invés de tentar responder, escolhemos não perguntar.
Essa má vontade frente ao subjetivo consagrou o “fantasma na máquina” (Séc. XIX). Filósofos, artistas, pessoas pensantes se perguntavam: “Se o universo interior da mente não existe, o que eu faço com tudo isso que sinto dentro de mim”? Foi uma época de exacerbação de dualidades. De um lado, o positivismo e o empirismo no auge. De outro, o existencialismo, o idealismo, o romantismo a cavar erraticamente as entranhas do fantasma.
Na época da psicanálise emergiu nova abordagem para estudos em humanas. Na base da nova metodologia, a interpretação:
Não existe (como defendem os empiristas) “a” verdade; Existem simultaneamente a minha verdade, a sua verdade. Ambas verdadeiras. Tantas "verdades" quantas pessoas para interpretá-la. Essa visão (relativista - construtivista) deu o impulso para a filosofia no séc. XX. Isso não interferiu no desenvolvimento das ciências empíricas, da medicina, da física, química, que continuou a todo vapor.
Aos poucos emerge a visão de que aspectos diferentes da realidade requerem métodos e abordagens diferentes de estudo.
Esta premissa está longe de ser consenso na academia. Cada área acusa a área rival de ser uma fraude. Acompanhe: Não dá para estudar a mente com o electroencefalograma (então, para os médicos, a mente não existe). Mas para a psicanálise (assim como para o artista - educador), o filet mignon é a "mente", não o cérebro.
Não é má vontade com a ciência empírica. Cabe valorizá-la onde ela brilha e restringi-la onde não funciona. Nós exploradores da mente deveríamos adotar a prática (política) de denunciar esse mau uso. É o que estou tentando fazer.Vivemos num ambiente culturalmente ainda dominado pela visão empírico - cientifica. Assim funcionam hoje os meios ditos "sérios".
Muitas vezes áreas como artes e psicologia vivenciam dificuldades para se afirmarem como ciências ou disciplinas "respeitáveis". Acabamos recorrendo à metodologias empíricas para ganhar credibilidade.
Somos patinhos feios, implorando a aceitação da "mamãe cisne" social que só reconhece o empírico. Hello patinho! O seu brilho está além da capacidade do empírico. Ele não vai te detectar (assim como o "eletro" não detectará seu mundo interior!).
É preciso criar entre nós, educadores, artistas, psicólogos, consenso em torno de metodologias mais adequadas para o estudo da subjetividade humana, seja ela coletiva (como a hermenêutica, por exemplo) ou individual (como a fenomenologia, por exemplo).
É claro que a abordagem empírica pode ser útil em estudos que visam à quantificação de dados em Arte - educação. Mas a urgência de estudos se dá justamente na necessidade de maior “compreensão”, “interpretação”, “tradução” das demandas sociais, psicológicas, filosóficas e políticas que encontramos na prática pedagógica.
Ainda busco discernimento maior sobre o tema, mas isto me parece claro:
Nós, exploradores do subjetivo e formadores de opinião precisamos em primeiro lugar acreditar que o nosso objeto de estudo é REAL e tem valor. Resgatar nossa auto-estima dos porões do século XIX, e defender a legitimidade dos estudos subjetivos com metodologias subjetivas. Eis nossa tarefa histórica.
Até mais.

2 comentários:

Anônimo disse...

Fala André! Interessante (como sempre) seu ponto de vista, mas acredito que o respeito ou a "importância" clamada está estritamente ligada à grana. O relativismo da realidade muito presente nas artes e nas mentes, amedronta (com certa razão)quem banca monetariamente a idéia; aquela estória de "pimenta nos olhos dos outros". Daí a estratégia de mascarar um conteúdo de forma rebuscada ou científica, denotando fidalguia e reinvindicando relevância na esperança talvez, de um quinhão do Rouanet; afinal, precisamos do pão-nosso-de-cada-dia. Ainda mais quando as artes ou mentes não se encontram em ressonância com tempo e espaço presentes. (Não que seja necessário, mas quem vai pagar o pato?)
Abraço,k.

Andre Barreto disse...

Caro Frederico:
É uma honra recebê-lo. Sua opinião é importante para mim.
Apareça de vez em quando.
Um abraço.